Tem cartas para Julieta!

Image by Adriano Gadini from Pixabay

Querida Julieta,

não vou lhe perguntar se a sua história, que no passar dos anos consagrou Verona como a cidade do amor, é verdadeira ou uma lenda. A magia, a força e o poder que a sua história possui para manter vivo o amor são suficientes para mim. Durante séculos, você tem demonstrado ser uma boa ouvinte, atenta às dores do coração, a amiga que está sempre presente e talvez a última esperança para quem não tem mais ninguém a quem compartilhar seus sonhos ou confidenciar seus segredos. Querida amiga, com certeza também neste ano, no dia de São Valentino, você irá ouvir alguém dizer “tem cartas para Julieta!”

A sua cidade respira (e suspira) amor.

Tantos precisam desabafar e buscam o seu amparo. Contam a você os seus sofrimentos procurando uma palavra de conforto, pedem uma sugestão sobre como expressar o amor que carregam dentro de si (sim, querida Julieta, são tantos os Romeus que não sabem falar de amor). Existem também aqueles que querem saber o que fazer para encontrar os seus Romeus ou as suas Julietas. Ou ainda aqueles que desejam somente lhe contar a própria história ou um momento vivido de felicidade. A verdade é que cedo ou tarde aquilo acontece a todos nós, nos apaixonamos, e mesmo se por Mateus, Antônio, Francisco ou Romeu, a pergunta permanece sempre aquela feita por você “Romeu, Romeu! Ah! Por que és tu Romeu?”

As cartas para Julieta se tornaram uma tradição

Enquanto existirem perguntas, existirão também os “secretários de Julieta” para dar respostas. Com certeza perguntas não faltarão para a equipe de voluntários que se ocupa em recolher as cartas para Julieta e responder a cada uma delas, mesmo aquelas enviadas apenas com o endereço “Julieta, Verona”. Sim, a magia existe, as cartas para Julieta somam até 50.000 por ano e chegam de todas as partes do mundo, escritas pelos mais variados remetentes, desde a adolescente que vive o primeiro amor até o homem de negócios apaixonado.

A tradição dessas cartas se remete a 1937 quando o “primeiro secretário de Julieta”, Ettore Solimani, guardião do túmulo de Julieta, comovido pelo conteúdo das cartas deixadas pelos turistas, começou a recolher e a respondê-las. Durante 20 anos, ele levou adiante essa tarefa sozinho pelo simples prazer de realizá-la. Ettore tinha sempre uma palavra de consolo para oferecer e firmava cada uma das cartas como “sua Julieta”, até 1957, quando foi obrigado a se aposentar. Depois disso, a incumbência passou para alguns voluntários, habitantes de Verona, até que em 1972, Giulio Tamassia, juntamente com um grupo de amigos, teve a ideia de criar o Clube de Julieta, uma associação sem fins lucrativos e cujo único objetivo é manter viva a história dos dois amantes veronenses, difundindo pelo mundo o amor vivido por eles.

O Clube de Julieta não mede esforços para manter quotidianamente essa tarefa e quando a história contada requer maior atenção não hesita em procurar a ajuda de um psicólogo local ou de instituições habilitadas em torná-la mais concreta e significativa. Além de responder às cartas, o Clube organiza na semana de São Valentino, em fevereiro, o prêmio “Querida Julieta”, que chega à sua 30a edição e prevê a escolha das mais belas cartas escritas no ano precedente. O Clube coordena ainda o prêmio literário internacional “Escrever por amor” escolhendo o melhor livro de amor publicado na Itália e comemora o “Aniversário de Julieta”, em setembro, com festividades nas praças de Verona. O slogan deste ano (2022) é “Verona in Love – Se você ama alguém, leve-o para Verona”. Certamente nos unimos ao coro “Love. (All we need is)”.

A identificação da nobre família Cappello com os Capuletos deu origem à convicção de que a casa acima seja a casa de Julieta. Ao atravessar o pórtico de entrada podemos ver o balcão dos apaixonados. A casa de Romeu se encontra a poucos passos da casa de Julieta.

Verona - cidade de Romeu e Julieta

No dia de São Valentino, 14 de fevereiro, o amor nos espera em Verona, cidade de Romeu e Julieta. Há exatamente dez anos me vi acidentalmente envolvida nesse encontro e posso dizer que o ar que se respira na cidade nessa data é diferente. A magia pode ser sentida ao longo da rua Cappello onde se encontra a casa de Julieta e no interior dos muros que a circundam onde a lendária cena do balcão é interpretada pelos atores que revivem os dois amantes. Verona tem muito para mostrar. Tão logo atravessamos as portas do muro medieval temos diante de nós a Arena, um anfiteatro romano que hoje abriga eventos culturais diversos. Seguindo o itinerário romântico chegamos à praça “delle Erbe”, à casa de Julieta e, depois de alguns passos, à casa de Romeu. É possível visitar também o túmulo de Julieta que se encontra no Museo degli Affrechi [Museu dos Afrescos].

Na cidade tem quem conta que a casa de Julieta pertencia à família Cappelletti, que provavelmente foi transformada em Capuleto na lenda shakespeariana, assim como a de Romeu Montecchi (em português, Montéquio) era a residência da família Monticoli. Ninguém sabe ao certo. A existência dos amantes veronenses encerra em si um mistério. Alguns sustentam que Capuleto e Montecchio existiram, outros que a tragédia romântica de Shakespeare, publicada originalmente em 1596, é somente fruto da imaginação. Cabe a nós, a esse ponto, manter viva a história de amor vivida por eles e acreditar no amor verdadeiro. Cabe a nós manter vivo o nosso coração onde quer que nos encontremos no mundo, mesmo que as palavras ditas por Romeu e impressas em uma placa colocada ao lado de um pequeno busto de Shakespeare na entrada da cidade nos avise que “não existe mundo fora dos muros de Verona”, como se quisesse nos dizer: o amor mora aqui.

arena de verona

Aos amantes do cinema existem dois filmes que valem a pena serem vistos ou revistos: Romeu e Julieta, de Franco Zeffirelli, e Cartas para Julieta, de Gary Winick.

 

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E assim surgiu a história da Befana

La Befana
La Befana

“A epifania encerra todas as festas” é um velho ditado na Itália. Na verdade, 6 de janeiro marca o fim da temporada de férias. As comemorações do Natal e do Ano Novo passaram e tudo volta à normalidade. É o início de um novo ano e a Befana (termos derivados de epifania que significa manifestação) se esforça para nos confortar nesta transição. Diz a tradição que nas primeiras horas da madrugada, entre 5 e 6 de janeiro, a velha Befana passa por nossas casas para encher as meias penduradas na lareira com balas, bombons, biscoitos e chocolate. Mas, fique atento, porque você também poderá encontrar sua meia cheia de carvão, que simboliza as más ações praticadas no ano que passou. A Epifania ou Dia de Reis é também a festa da Befana, feriado na Itália, hora de desmontar a árvore de Natal. Ano Novo Vida Nova!

Então, o que a Befana deixou para você este ano? Doces ou carvão? Ok, eu sei, você afirma que se comportou bem, então certamente você ganhou doces ou, quem sabe, algum presente bonito. Mas me deixe adivinhar, se você foi um menino travesso, este ano você recebeu só CAR-VÃO! Você quer saber o que achei dentro da minha meia… Hmmm! A festa de Befana é uma tradição típica italiana e a carismática velhinha é esperada com ansiedade pelas crianças. Montada em sua vassoura voadora, ela cruza o céu carregando sua cesta cheia de guloseimas. A origem de tudo isso vem das tradições mágicas pré-cristãs.

A lenda diz que quando os três Reis Magos se dirigiram a Belém, levando presentes para Jesus, eles tiveram dificuldade em encontrar o caminho, então, pediram ajuda a uma senhora idosa. Agradecendo sua ajuda e gentileza, eles a convidaram para acompanhá-los. A velha que estava muito ocupada limpando a casa, recusou, mas logo depois percebeu que acabará de cometer um grande erro. Então, Befana encheu uma cesta com presentes e saiu, tentando alcançar os Reis Magos. Apesar de seguir a mesma estrela que eles, ela nunca chegou ao estábulo onde Jesus nasceu e por isso foi entrando nas casas e deixando presentes para as crianças na esperança de que alguma delas fosse o menino Jesus.  Por isso, sempre no mesmo dia, ela monta em sua vassoura e dá a volta ao mundo, entrando nas casas e deixando presentes para as crianças esperando ser perdoada.

Dessa forma, quem foi bonzinho no ano que passou encontrou doces dentro da meia. Os endiabrados, não! Esses encontraram apenas carvão! Mas não precisa se preocupar, pois no ano que vem ela volta! E acredite em mim, ela é uma mistura de bruxa, fada e maga, ora generosa ora severa, mas nunca má… seu carvão é feito de açúcar, mas isso fica aqui entre nós! Despista e comece a cantar:

“A Befana vem no escuro
Com seu sapato cheio de furo
Vem com a saia remendada
A Befana é sempre amada!

 

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Pinóquio completa 140 anos, mas o velhinho é Gepeto ;)

Pinocchio
libro Pinocchio

“Era uma vez…
‘Um rei!’ dirão logo os meus pequenos leitores.
Não, meninos, vocês se enganaram. Era uma vez um pedaço de pau.”

Pinocchio

Dominio Público

Há cento e quarenta anos nasceu o boneco Pinóquio, esculpido em um pedaço de madeira por um adorável velhinho, o carpinteiro mestre Gepeto. E depois? Depois tem o Grilo Falante (a consciência de Pinóquio), a Fada Azul, João Honesto (a Raposa), Gideão (o Gato) e tantos outros que dão vida a essa obra-prima da literatura italiana. A grande sacada dessa história, no entanto, é perceber que Pinóquio precisou passar por uma transformação interior, um verdadeiro despertar da consciência, para ser capaz de manifestar seu grande desejo. O bonequinho de madeira se transformou em um menino de verdade, em carne e osso. Como ele mesmo disse, “um bom menino” porque entendeu os erros cometidos. 

Pinóquio apareceu pela primeira vez em 7 de julho de 1881 no Giornale per i bambini, o primeiro jornal italiano dedicado aos leitores infantis. A história foi publicada em tirinhas. O último episódio, porém, caiu como uma bomba sobre os leitores que, desapontados, escreveram para o jornal pedindo um final

diferente. O pobre Pinóquio, na primeira versão, acabou enforcado em um frondoso carvalho. Apesar das dúvidas, Carlo Collodi, criador de Pinóquio, respondeu ao pedido dos leitores e, assim, com a ajuda da Fada Azul, o trouxe de volta à vida. Então, em 1883, o livro ilustrado “As Aventuras de Pinóquio. História de um boneco”, foi publicado pela Livraria Editora Felice Paggi.

Carlo Lorenzini (ou Carlo Collodi) nasceu em Florença em 24 de novembro de 1826 e transcorreu parte de sua infância em Collodi, pequena cidade medieval que lhe inspirou o pseudônimo, situada na província de Pistoia. Em 1844, interrompeu os estudos para trabalhar na livraria Piatti de Florença. Três anos depois, começou a colaborar com alguns jornais, escrevendo sobre música, teatro, literatura e humorismo. Collodi fundou dois grandes jornais naquela época na Itália: “Il Lampione, diário satírico, que foi obrigado a fechar em 1849, e o “Scaramuccia”, voltado para o teatro. Collodi morreu em 26 de outubro de 1890.

O bonequinho fala 260 línguas

Não é mentira, entre os livros italianos, “Pinóquio” é o mais traduzido e difuso no mundo. O boneco fala 260 línguas, de acordo com uma pesquisa publicada em 18 de maio de 2021, patrocinada por MareMagnum.com, plataforma italiana de pesquisa de livros antigos e usados. Mas podemos ir além: na classificação mundial dos livros, realizada pela 7Brands Inc., agência de tradução americana, Pinóquio aparece em segundo lugar, atrás somente de “O Pequeno Príncipe”, do francês Antoine de Saint Exupéry.

O filho adotivo de Gepeto, que se deixa conduzir por traquinagens e a cada mentira vê crescer o seu nariz, é o personagem literário italiano mais conhecido no exterior. A fama o levou também para o mundo do cinema, dos quadrinhos e do teatro. Pinóquio é reconhecido como um dos maiores sucessos da Disney (venceu dois prêmios Oscar em 1941) passando para a história como o segundo clássico Disney, depois de “Branca de Neve e os sete anões” de 1937.

Pinóquios, marionetes em madeira , em uma barraca na praça de Verona, Itália.

A outra face de Pinóquio

– Que nome lhe darei? – disse Gepeto para si mesmo  – Quero chamar-lhe Pinóquio. O nome dar-lhe-á sorte. Conheci uma família inteira de Pinóquios. Pinóquio o pai, Pinóquia a mãe e Pinóquios os meninos e todos estavam bem. O mais rico deles pedia esmola.

Pinocchio, em italiano, quer dizer "olho pineal"?

Gepeto explica a escolha do nome Pinóquio de maneira simples: é um nome que ele conhece e que dará sorte ao boneco. A essa explicação seguem-se outras que apontam as mais variadas razões, às vezes geográficas, outras botânicas ou até mesmo esotéricas. Alguns dizem que Collodi teria se inspirado na fonte do Colégio-Seminário episcopal de onde estudou, chamada “Fontana del Pinocchio“; ou ainda na zona do Pinocchio, San Miniato Basso, uma vila onde o seu pai teria trabalhado durante anos. Outros dizem que o nome vem das características do personagem feito de lenha. Pinocchio (em português Pinóquio) é outro nome dado ao pinolo (pinha), a semente do pinheiro.

A explicação que mais gosto, no entanto, é a esotérica e aqui tem assunto para mais um post. Pin-occhio, em italiano, é a junção das palavras “pino” (pinheiro) e “olho” (occhio). O pinheiro produz a pinha (pinolo) pequena semente de formato semelhante à nossa glândula pineal, também chamada de terceiro olho. As interpretações que podem ser dadas à história do Pinóquio vão da mais superficial, contada e recontada infinitas vezes, àquela mais profunda que fala de transformação do ser. O boneco de madeira, que representa o lado material, tomou consciência de seus atos, passou por um processo evolutivo interno e recebeu o dom da vida. Só depois de mudar por dentro é que a mudança externa ocorreu fazendo com que Pinóquio se tornasse um menino de verdade, dono de sua própria consciência, alma e, com certeza, de um coração. Pinóquio despertou e se aproximou do divino. Para ele o trabalho está feito.

Simbologia presente na praça do Vaticano:  o maior monumento do mundo dedicado à “pinha” ladeado por pavões, aves associadas à espiritualidade, ao despertar e à iluminação. A forma da tiara papal e de muitos outros acessórios usados pelo Papa são também baseados na pinha. Wikimedia Commons.

Falamos de uma história de 1881, quando Pinóquio foi capaz de ganhar para si uma consciência e dispensar o Grilo Falante da sua função de consciência externa. Hoje, em 2021, existem homens em carne e osso que acham mais cômodo ter um Grilo Falante que os acompanhe. Dessa maneira, eles vão pela vida, como um pedaço de pau, apoiados para sempre em suas consciências externas.

Pinóquio, desenho de  André Koehne – Creative Commons Attribution-Share Alike 3.0 Unported license. Um pouco mais acima, desenho de  Carlo Collodi e Pinóquio, também de André Koehne – Creative Commons Attribution-Share Alike 3.0 Unported license / Outros créditos: Créditos: livro: Wikimedia Commons desenhos Geppeto esculpindo Pinocchio, o gato e a raposa e Pinóquio correndo, todos de Domínio Público.

 

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Pinceladas para a eternidade – 500 anos de Rafael Sanzio

O ‘divino pintor’, gênio sensível, príncipe das artes, quase um Deus mortal. Todos esses títulos, provenientes de vozes espalhadas pelo mundo, são atribuídos a Rafael Sanzio, um dos maiores artistas do Renascimento. Há 500 anos de sua morte, as celebrações que levaram anos para serem preparadas na Itália foram suspensas em consequência da emergência Covid-19. Agora as obras repousam na escuridão, em salas climatizadas e, como todos nós, em uma longa espera durante esses tempos de distanciamento social. A mostra “é uma Bela Adormecida à espera do príncipe que irá despertá-la”, disse o presidente do museu romano, Mario di Simoni. A este ponto, porém, pouco importa se o príncipe chegará atrasado, pois as obras que nos foram presenteadas por Rafael são eternas.

No lugar de todos esses títulos, no entanto, dizer simplesmente ‘Rafael’ ou ‘Raffaello’, como é intitulada a mostra das Scuderie del Quirinale, em Roma, parece ser suficiente, já que ele pode ser facilmente reconhecido em suas obras. Os traços distintos das suas madonas com crianças, dos retratos de papas, cardeais e senhores do seu tempo, dos afrescos das salas do Vaticano e de tantos outros trabalhos que o tornaram famoso mundialmente, nos levam rapidamente ao mestre da pintura italiana, nascido em Urbino em 1943.

Filho do pintor Giovani Santi, Rafael foi influenciado pelo pai e muito cedo aprendeu as técnicas artísticas básicas. Com a morte de Santi, quando ele tinha apenas onze anos, o tio, sacerdote Bartolomeu, confiou sua formação ao pintor Pietro Vanucci, conhecido como ‘Perugino’. Em 1504, Rafael se transferiu para Florença e logo demonstrou vontade de conhecer Leonardo da Vinci e Michelangelo Buonarroti. Nesse período, ele pintou numerosos retratos, mais especificamente as madonas com crianças. No final de 1508, se mudou para Roma e recebeu do papa Júlio II a missão de concluir os afrescos nos apartamentos do Vaticano.

Mai do que nunca Rafael conquistava a admiração de todos e se tornava o artista mais requisitado da cidade. A pintura continuava sendo sua principal atividade, mas acabou cedendo espaço também para a arquitetura, estudada a priori para dar suporte à primeira. Foi como arquiteto que Rafael respondeu ao chamado do papa Leão X para substituir Donato Bramante, morto em 1514, na construção que marcaria para sempre a história da arquitetura, a Basílica de São Pedro, à qual se dedicaram também outros grandes mestres, como Michelangelo Buonarroti. Rafael morreu em 1520, com apenas 37 anos, e com ele extinguiu-se também o seu  projeto para a Basílica. Apesar de jovem, o ‘príncipe dos pintores‘, como é chamado por muitos, serviu de inspiração para diversos artistas nos séculos sucessivos, entre os quais Caravaggio e Salvador Dalí. [Fotos: auto-retrato de Rafael 1505-06, Uffizi, Florença (Raphael, Wikimedia Commons Public domain Mark 1.0). Detalhe da obra de arte “A Madonna Sistina” por volta de 1513-1514 (Raphael, Wikimedia Commons, Public domain Mark 1.0)]

Rafael Sanzio, mostras aguardam reabertura

As mostras interrompidas pela pandemia aguardam reabertura. Em Roma, a exposição ‘Raffaello 1520-1483′ reúne mais de 100 obas de arte provenientes de coleções e museus de todo o mundo. Somente a Galeria degli Uffizi de Florença contribuiu com cerca de 50 pinturas. A esperança é que a mostra com encerramento programado para 2 de junho, data limite para os contratos de empréstimo, consiga reabrir em tempo hábil. Enquanto se espera, a Galeria degli Uffizi preparou um tour virtual que pode ser acessado clicando aqui ou digitando a hashtag #RaffaelloOltrelaMostra. Outras comemorações serão reabertas na região das Marcas (Le Marche), onde nasceu Rafael, na Emília Romanha (em italiano, Romagna) e na Lombardia.

Não é somente a Itália a celebrar Rafael Sanzio. No Brasil, o Centro Cultural da Fiesp, em São Paulo, realiza a exposição Rafael e a Definição da Beleza’ com obras nunca mostradas no país provenientes de museus em Roma, Nápoles e Modena. Ainda em São Paulo, o Museu de Arte Moderna (MASP), conserva a única obra de Rafael que se encontra fora das coleções europeias e dos Esta

 

Unidos: a “Ressureição de Cristo, datada de 1502 e adquirida pelo museu em 1954. Também nos Estados Unidos, as comemorações estão em fase de espera. A National Gallery of Art, em Washington DC, celebra os 500 anos de morte de Rafael Sanzio com a mostra ‘Raphael and his Circle’, que no momento pode ser visitada somente no site da Galeria em um tour 3D.

Na Inglaterra, a National Gallery de Londres dedica uma grande mostra à Rafael. Com o título The Credit Suisse Exhibition: Raphael, a exposição será realizada de outubro de 2020 a janeiro de 2021 e irá expor mais de 90 obras provenientes de diversos museus como o Louvre, Vaticano, Uffizi e a Galeria de Arte de Washington. Em mensagem, o presidente da República Italiana, Sergio Mattarella, externou seu sentimento: “o desejo é que as portas possam ser reabertas o quanto antes e que daquele espírito renascentista que tornou as obras de Rafael incomparáveis possa ser retirada a energia que precisamos para o recomeço da Itália e da Europa”. Com os meus melhores votos!

A “Madonna Sistina”, entre as pinturas  mais famosas de Rafael (1513-14). (Raphael, Wikimedia Commons Public domain mark 1.0)
“Il Trionfo di Galatea”, afresco de Rafael Sanzio, em torno de 1512, Villa Farnesina, Roma. (Raphael, Wikimedia Commons CC BY-SA 3.0)
“O Retrato do papa Júlio II”, 1511, National Gallery de Londres. Uma segunda versão datada de 1512 é conservada na Galleria degli Uffizi, Firenze. (Raphael, Wikimedia Commons  Public domain Mark 1.0),
“A Ressureição de Cristo”, 1501-02, conservada no Museu de Arte de São Paulo, Brasil. . (Raphael, Wikimedia Commons Public domain Mark 1.0)
“São Jorge e o dragão”,1505, National Gallery of Art, Washington, USA. (Raphael, Wikimedia Commons Public domain Mark 1.0)

 

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Café solidário: uma xícara de gentileza

coffee break kindness generates kindness

coffee break kindness generates kindness

“Quando alguém está feliz em Nápoles, paga dois cafés:
um para si mesmo, e um para outra pessoa.
É como oferecer um café ao resto do mundo.”
Luciano De Crescenzo, em seu livro intitulado,“Il caffè sospeso”.

A pausa para o café sempre foi um momento de descontração e agora vou fazê-los saborear a bebida que se vangloria por ter tantos apaixonados na Itália. Eu a ofereço com uma curiosidade: o caffè sospeso (café solidário no Brasil). Essa xícara de gentileza é uma antiga tradição napolitana de solidariedade, que já inspirou documentários, livros e concursos literários. Tem quem diz: ‘somente depois do café eu me… expresso’. A verdade é que café e bom humor fazem parte da vida dos italianos. Não existe dia sem um café… e nem sem uma boa risada.

Eu disse um café? Na verdade, 80 mil xícaras de café são servidas todos os dias na Itália e frequentemente são acompanhadas daquelas “tiradas” típicas, algumas inteligentes e outras nem tanto,

mas que muitas vezes são capzes de desenhar um sorriso em nosso rosto. Não importa quanto cinzento seja o dia, basta uma pausa para o café para provocar um desses bons momentos. 

Algumas xícaras trazem gravada a frase caffè al volo que seria tomar café “voando”, e alguns bares propõem desafios al volo, como escrever um pequeno conto no tempo de um café, quase sempre muito rápido aqui na Itália. Em outros, é possível pegar ou trocar livros e até topar com um DJ que convida os clientes a abandonar a timidez e cantar uma canção em transmissão direta para a rádio. No programa matutino da Rádio Padova escutei grandes talentos. Se o ‘pingado’ é adoçado com amor tudo se torna possível.

pausa caffè

Café solidário

Café e criatividade nunca faltam e são preparados para satisfazer todos os gostos. Espresso (expresso), americano, cappuccino, macchiato caldo (pingado quente), macchiato freddo (pingado frio), com leite à parte, em xícara grande, correto (corrigido com licor)… a lista é longa. Mas, como era mesmo aquela história sobre o caffè sospeso que acabou virando documentário?  Bem, o cliente pede um café e paga dois deixando o segundo para ser oferecido a quem, talvez naquele dia, não disponha de nem sequer uma moeda para conceder a si mesmo o mimo de um cafezinho. Sendo assim, quando a vontade aperta ou o frio congela os ossos resta refugiar-se em um bar e perguntar se tem um ‘sospeso ou solidário. Se tiver, uma xícara de café será servida imediatamente.

Embora hoje não seja mais um ato costumeiro, muitas ações permitem manter viva a tradição do café sospeso. Alguns reservam um dia especial para lembrá-lo e, felizmente, muitos tomam a iniciativa e levam adiante a proposta, como aconteceu recentemente na Feira de Milão, que serviu 7.000 cafés solidários. A ideia se transformou também em um aplicativo: Caffé pagato conviene a Tutti (Café pago convém a todos) e a comunidade cresce a cada dia. O app Caffé Pagato já conta com 9 mil inscritos e com cerca de 100 bares afiliados. Um gesto concreto de amizade que se espalha pelas cidades italianas. O aplicativo pode ser baixado gratuitamente na App Store ou no Google Play.

A prática do café sospeso representa uma forma de gentileza ou caridade ao próximo. Um gesto tão natural e simpático que atravessou os limites de Nápoles, conquistou outras cidades  italianas, como Roma e Milão, e chegou ao exterior: Reino Unido, França, Estados Unidos e até o Brasil já aderiram. Assim, sem muito estardalhaço, o cafezinho pré-pago vai por aí ajudando a esquentar o corpo e o coração de muita gente, principalmente nos dias mais frios de inverno.

pausa caffè
cartaz com preços do café

Café com belas maneiras

Não é só gentileza que conta na hora do cafezinho. Se você não economizar na educação provavelmente irá economizar no bolso. Não é raro encontrar sobre o balcão, em tom de brincadeira, um aviso informando que o preço do café varia de acordo com a maneira como o pedido é feito: ‘um café’ = € 3,00; ‘um café por favor’ = € 2,00 e ‘bom dia, me faça um café por favor? = €1,00. “Gentileza gera gentileza”, já dizia José Datrino, personalidade urbana brasileira, conhecido no Rio de Janeiro como o ‘profeta Gentileza’. Para quem quiser descobrir mais sobre esse personagem muito amado pelos cariocas ficam os links aqui e aqui.

caffè sospeso

 

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Carnaval de Veneza, uma experiência única.

carnevale venezia
carnevale venezia
carnevale venezia

O carnaval de Veneza é algo para ser vivido pelo menos uma vez na vida, não tem nada igual. É como acordar durante um sonho e perceber que está na praça São Marcos no século XVIII. O mundo mudou fora e muda dentro de você. Cores, rendas, apliques, veludos suaves, a beleza das fantasias e o mistério, escondido nos olhos, por trás das máscaras. Não existe nada mais fascinante do que o mistério e a maravilha estampada nos olhos. Pois bem, é carnaval! Impossível não falar sobre a beleza e a magia que se vive em Veneza nesses dias.

A origem do carnaval de Veneza remonta a 1094 quando, pela primeira vez, o vocábulo foi usado para descrever diversão pública. Mas, foi no século XVII que o carnaval ganhou prestígio. Os nobres também queriam se divertir e através do anonimato permitido pelas máscaras se misturavam ao povo nas ruas. Usar uma máscara significava não revelar a identidade, o sexo e a classe social. Assim, era possível entrar em um mundo ilusório onde tudo era possível e permitido. O ato de tirar a máscara e revelar o rosto muitas vezes sinalizava disponibilidade à abordagem dos pretendentes. Em cada história, o possível epílogo tinha origem na ‘magia’.

Máscaras, símbolo de liberdade.

carnevale venezia pierrot

As máscaras se tornaram símbolo da liberdade. A bauta, usada tanto por homens quanto por mulheres, é uma das mais antigas e tradicionais e nunca falta no carnaval de Veneza. Ela é composta por uma máscara branca sob um chapéu de três pontas e um amplo manto negro chamado tabarro. Mas isso não é tudo. Não existe carnaval em Veneza sem Arlequim, Colombina, Gato, Moretta e, obvio, o meu preferido, o belíssimo Pierrot… Ok, me concedo uma lágrima para sonhar esse apaixonado, tão romântico quanto infeliz!

O mundo, porém, algumas vezes se mostra estranho. Em 1797 a beleza do carnaval de Veneza foi proibida por Napoleão Bonaparte, após a invasão do Norte da Itália. As máscaras foram banidas por temor de desordem e invasões por parte da população. Somente quase dois séculos depois o evento foi retomado, assim como também a tradição das fantasias. Dessa maneira, se desencadeou em Veneza um verdadeiro comércio de máscaras.

Com o resgate das festas e com as tradições restabelecidas, os artesãos recuperaram tudo aquilo que parecia esquecido e aprimoraram o negócio. Atualmente utilizam diversas técnicas e materiais e realizam cursos para quem quiser aprender a arte de produzir máscaras. Trabalham argila, gesso, gaze, porém as mais artesanais são aquelas elaboradas seguindo a tradição antiga em que o papel machê, composto de restos de papel absorvente picado e cola, é obido rigorosamente através do trabalho manual.

Para produzir as máscaras venezianas mais cobiçadas, primeiro cria-se o modelo e o molde no qual o papel machê é trabalhado e colocado para secar. Removido o molde, é hora de terminar a obra decorando-a e enriquecendo-a com plumas, missangas, desenhos e tudo o que a imaginação permitir. Nesse caso, palavras não dizem muito, somente as imagens são capazes de descrever tanta beleza.

carnevale venezia

No meio de tanta gente tem até quem conseguiu tirar um cochilo.

🙂

 

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Máscara de carnaval vetor: Pixabay

No dia do imigrante italiano, um tributo a Valentino e Elvira

A pequena cidade de Torreglia, situada no Veneto, também acrescenta história ao livro intitulado Itália do qual até mesmo meus bisavós Valentino e Elvira foram coautores. Mantendo viva a memória, resgatamos nosso passado.
Este é um relato de despedidas e de encontros, um pequeno parágrafo dessa história escrita por quem um dia partiu de Torreglia, porém ainda desconhecido para aqueles que hoje vivem e constroem a Torreglia do futuro.
 Sinto-me afortunada pela oportunidade de reportar, com Valentino e Elvira, uma história distante e esquecida e por nela ter encontrado as minhas raízes. Não tem data melhor do que 21 de fevereiro, dia do imigrante italiano no Brasil, para publicar essa homenagem aos tantos “Valentinos” e “Elviras” que partiram em busca de melhores oportunidades de vida e de trabalho.

Tudo começou quando …Na America

Tudo começou quando o Brasil, sentindo ser necessário substituir a mão de obra escrava, teve conhecimento que grupos de imigrantes europeus estavam deixando seus países em busca de uma vida melhor do outro lado do Atlântico. O canto da sereia chegou em forma de tantos panfletos quanto possível, cheios de promessas irresistíveis, que diziam: “…na América. Terra no Brasil para os italianos. Navios partem todas as semanas do porto de Genova. Venham construir seus sonhos com a família. Um país de oportunidades. Clima tropical e moradia para todos. Riquezas minerais. No Brasil vocês poderão ter o castelo de vocês. O governo dá terra e equipamentos para todos.” Assim, em 21 de fevereiro de 1874 chegou ao Brasil a primeira expedição de italianos.

Valentino e Elvira não foram os primeiros a desembarcar, mas certamente cresceram juntamente com esse sonho. Sim, eles ousaram, e em busca desse sonho partiram ainda jovens (ele com 25 e ela com 21 anos) da via Vallorto, em meio às colinas, para uma longa e desconhecida viagem. Casados há apenas quatro meses, naquele abril de 1896, eles subiram a bordo do vapor Rosário, no porto de Genova. Em Torreglia, deixaram a família, os amigos e o coração. Na mala colocaram só a esperança de uma vida melhor e quando se afastaram do porto não sabiam, mas estavam dando adeus à Itália.

Aqueles eram anos difíceis na terra natal, e no além-mar muitas eram as promessas de uma nova vida. Valentino e Elvira eram apenas mais dois entre os milhares de italianos que responderam a esse chamado. A decisão de emigrar não era uma escolha livre, vinha da necessidade e, por isso, havia sempre a esperança de retornar à pátria. Para Valentino e Elvira não foi diferente. Depois de um mês de viagem, no dia 02 de maio de 1896, mais precisamente há 124 anos, desembarcaram no porto do Rio de Janeiro. Tinham conseguido, juntamente com outros 953 passageiros de terceira classe, vencer as intempéries da viagem e as doenças. O destino do casal era Juiz de Fora (minha cidade natal), no estado de Minas Gerais. Valentino e Elvira não sabiam que daquela decisão começavam a traçar também a minha história.

Além das fronteiras: trabalho duro, família e saudade

Valentino Fasolato, primogênito de seis filhos do casal Giuseppe Fasolato e Antonia Pravato, nasceu no dia 28 de junho de 1870. Além dos pais e parentes, deixou em Torreglia seus dois irmãos, Luigi e Adamo (este último se casou com Domenica Gallo), e a irmã, Angela, que anos mais tarde esposou Agostino Bernardi. Elvira Pressato nasceu em 4 de fevereiro de 1874 e era filha de Giovanni Pressato e de Scolastica Neri. Juntos, Valentino e Elvira começaram uma grande família Fasolato que ultrapassava as fronteiras de dois países unindo culturas diversas. Tão logo chegaram à Minas, o casal se instalou em Sarandira, distrito de Juiz de Fora, onde Valentino trabalhava a terra, como havia aprendido em Torreglia.

Mais tarde, com a mudança para Juiz de Fora, Valentino se estabeleceu como jardineiro. Começou um pequeno horto onde cultivava, vendia mudas ou as usava para dar vida aos jardins das casas mais elegantes da cidade. A vida era dura, feita de muito trabalho, e como todos os imigrantes italianos naquela época, Valentino e Elvira aprenderam também a conviver com a saudade que afligia continuamente o coração. A esse ponto, o pensamento de retornar à pátria, reencontrar a família, os amigos, retomar os hábitos, reviver os sabores e os odores da terra natal pareciam mais distantes. A situação econômica, o trabalho, os filhos, oito no total, faziam com que seguissem em frente e se empenhassem ainda mais para melhorar e consolidar a estabilidade da família.

Hoje, no Brasil, existem centenas de descendentes dos Fasolato e, no geral, todos os descendentes de italianos do país já somam cerca de 28 milhões.

É preciso recontar para não cair no esquecimento

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Alguns com maior sorte, cada um com o próprio destino. Na verdade, o “paraíso” que fez nossos bisnonni e nonni sonharem estava longe de ser real. Apenas chegavam, os imigrantes eram levados para a Hospedaria dos imigrantes onde passavam por uma triagem para avaliação do estado de saúde e, em seguida, eram colocados em trens e levados para os lugarejos mais distantes. Os “castelos” eram casas velhas e primitivas ou um teto ainda por ser constuído, longe das cidades. Eles se sentiam confinados, isolados e estavam sujeitos às doenças tropicais. Não tinham transporte, não podiam se comunicar com a terra natal, não falavam a língua local, não tinham qualquer assistência, nem médica nem religiosa. Estavam carentes de tudo. O vinho e o queijo deram lugar à farinha de mandioca. Hábitos e tradições foram violados e laços familiares rompidos.

Para retomar suas vidas, os imigrantes italianos tiveram que cortar duras amarras colocadas por aqueles que os exploravam. Lutaram contra a ganância e o egoísmo, criaram famílias, novos hábitos,

 

plantaram, colheram, ergueram cidades, recuperaram tradições, aprenderam, ensinaram. O vinho e o queijo voltaram à mesa e muitos, como Valentino e Elvira, ousaram novamente: sobreviveram. Valentino viveu 45 anos no Brasil e Elvira 49. Foram anos de trabalho duro e saudade. Anos passados a sonhar em retornar ao seu país; anos de alegria e lágrimas. Quando partiram para o mundo espiritual, ambos tinham 70 anos, Valentino e Elvira talvez não saibam, mas, com certeza, a missão deles foi cumprida. Deles herdei o sangue, os valores, a cidadania italiana, o interesse pela Itália, pela língua, cultura, música e não só, herdei também o sonho. Fiz por Valentino e Elvira a viagem que jamais conseguiram fazer, comigo eles retornaram para a Itália e quem sabe um dia conseguirei levá-los de volta para casa, para sua querida Torreglia. Morar em Torreglia é ainda um sonho.

Neste 21 de fevereiro de 2020, dia do imigrante italiano no Brasil e quando o movimento migratório italiano completa 146 anos, recebam esta história como uma declaração de amor!

Núcleo urbano primitivo em Caxias do Sul, “Sede Dante”, 1876-77 aproximadamente. (Unknown Author, Wikimedia Commons Public Domain Mark 1.0

 

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A Itália é como um livro – Venha ler!

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Perambular pelas ruas na Itália é viajar na história. Voltamos no tempo e nos descobrimos protagonistas deste enorme livro. Uma belíssima edição ilustrada e em cores. Cada esquina tem alguma coisa para nos contar. Basta estar atento e ouvir. Saint-Exupéry, autor de O Pequeno Príncipe, escreveu: “Somente podemos ver bem com o coração”. Mesmo podendo perceber a Itália através de todos os nossos sentidos, somente o coração pode ver aquilo que é invisível aos nossos olhos… o essencial. A arte, literatura, cinema, arquitetura, o aroma do cappuccino, o cheirinho da pizza, o sabor do vinho, as janelas floridas, o acordeão que pelas ruas toca O Sole Mioa Itália é tudo isso!

Para mim a Itália tem algo mágico. Encontrar nas páginas desse hipotético livro a minha própria história, as minhas raízes, tem um valor indescritível. E foi em Torreglia, uma pequena e acolhedora cidade da província de Padova, no Vêneto, que encontrei um capítulo especial. Neste resumo, faço uma introdução sobre o que a Itália tem para contar.  Acompanho vocês nesta viagem!

italia-livro

  A Itália em capítulos– da Pré-história à Idade Média…

Correzzola is magically set to revive the Middle Ages
Correzzola magicamente ambientada para reviver a Idade Média
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O primeiro capítulo desse livro nos leva à Pré-história. A Itália era habitada já no período Paleolítico e, segundo artigo publicado na revista National Geographic, o sítio arqueológico Monte Poggiolo, na Emilia Romagna, é a mais antiga evidência da presença humana na península. “Eram Padanos os primeiros habitantes da Itália. Os primeiros hominídeos chegaram ao Vale do Pó há cerca de 850 mil anos, após drásticas mudanças climáticas”, afirma o artigo.

No segundo capítulo, um giro pela história antiga nos faz resgatar as civilizações etrusca, fenícia, grega e romana. Palermo, fundada pelos fenícios, Nápoles e Roma representam as cidades mais importantes deste período. Folheando as páginas descobrimos que a organização sócio-política romana deixou uma marca indelével na história. Os romanos construíram cidades, portos, estradas, aquedutos e fortificações e não é raro nos vermos frente a frente a um sítio arqueológico romano. A história se abre viva diante de nossos olhos.

Quer dar uma volta pela Idade Média? Ok… isso também é possível. As festas medievais são sempre uma atração. Eu tive o prazer de viver o período medieval em Correzzola, (fotos) município da província de Padova que, desde então, é habitado por uma pequena comunidade. Todos os anos, em julho, Correzzola é magicamente ambientada para reviver o período das trevas e… minha nossa, que aventura! Acabei com a cabeça no pelourinho (gogna em italiano) que, na verdade, é o final da palavra vergogna (vergonha em português) e é exatamente isso que sentimos quando nos encontramos naquela posição embaraçosa. Por sorte, o meu “carrasco” de Correzzola tinha bom coração e me libertou ou eu não estaria aqui contanto o terceiro capítulo deste livro.

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O Renascimento, a Idade Moderna, o Ressurgimento, as guerras…

E aqui estamos nós, orgulhosos por combater pela unidade nacional, participando, deste modo, do Ressurgimento Italiano. O Reino da Itália é proclamado, a capital é transferida para Roma e o dialeto toscano é escolhido como língua oficial. Mais tarde, explodem as guerras que deixam marcas. Ainda hoje encontramos pequenas, mas profundas, feridas nos muros, cicatrizes eternas mantidas em memória aos conflitos. Pesquisando encontrei a Brigada Fasolato, uma das tantas que lutou pela Resistência. Tenho perguntado a mim mesma se tive algum parente “partigiano”, mas essa ainda é uma pesquisa para se aprofundar.

No quarto capítulo viajamos com destino à Idade Moderna. O portão de embarque é o Renascimento, um período de transição e mudanças na história europeia. Florença desempenha um papel importante neste percurso no qual encontramos Dante, Giotto, Petrarca, Boccaccio, Donatello, Michelangelo, Leonardo… São muitas as páginas que se somam neste voluminoso livro. As descobertas geográficas, as invenções… Marconi inventou o rádio e Meucci, apesar do reconhecimento tardio, inventou o telefone. É o início de uma nova era.

E muito mais por descobrir:

Este livro nos conta ainda muito mais. Em suas páginas verificamos como Veneza, a cidade que parece flutuar, foi construída. A beleza incomparável de Veneza é um convite para se perder em suas calli, passagens estreitas, seguir o movimentar das gondolas… se apaixonar em e por Veneza. E, então, pegar o vaporetto e desembarcar na magia das cores de Burano. Para nós, uma caminhada de encantamentos. Para os pescadores que moram na ilha, no entanto, as cores variadas e fortes com as quais pintam suas casas servem para auxiliá-los a encontrá-las quando imersas na névoa espessa. A história passa diante dos nossos olhos como uma obra de arte do cinema italiano e enquanto cantarolamos “Nel blu dipinto de blu compreendemos, sim, que a vida é bela. No livro Itália, páginas e mais páginas são inseridas diariamente.

David by Michelangelo - a masterpiece of Renaissance

David de Michelangelo (Foto de Jörg Bittner Unna – Creative Commons Attribuzione 3.0 Unported) David-detalhe da mão (Foto de Rabe! – Attribution-Share Alike 4.0 International)

Cupido e Psique por Antonio Canova, 1787. (Foto de gadgetdude Creative Commons – Attribution 2.0 Generic.

Torreglia, um capítulo especial.

"La caduta degli angeli ribelli" (A queda dos anjos rebeldes) de Agostino Fasolato (c.1750): 60 figuras esculpidas em um único bloco de mármore de Carrara. A obra de arte faz parte da coleção do banco Intesa Sanpaolo e está exposta permanentemente nas Gallerie d'Italia, em Vicenza.

Acabamos de chegar em Torreglia, situada aos pés das Colinas Eugâneas. Um lugar especial para mim porque ali encontrei as minhas raízes. Folheando os antigos registros mantidos pela paróquia e pelo cartório municipal encontrei inúmeros Fasolato. Alguns famosos, como Giacomo Fasolato, escritor, linguista e lexicógrafo, nascido em Torreglia em 1682. Ele apreciava tanto o Latim que latinizou a grafia de seu nome tornando-se Jacopo Facciolati. Numerosos também os registros dos Fasolato pertencentes à ordem dos escultores e trabalhadores das pedreiras que figuram nos documentos conservados pelo Arquivo de Estado de Padova. Entre eles, Agostino Fasolato (1750 aproximadamente) que esculpiu 60 figuras em um único bloco de mármore de Carrara com altura de quase dois metros. “La caduta degli angeli ribelli”, (em português, “A Queda dos Anjos Rebeldes”), foi o nome dado por ele à sua obra.

Porém, foi diante de uma pequena casa feita de pedras e pedaços de tijolos que eu toquei a história mais profundamente. Ali, na via Vallorto, viveu meu bisavô, Valentino, e olhando aquela casa um filme se passou pela minha mente. Imaginei a casa habitada, iluminada somente por uma fraca luz que mal alcançava a janela… Sim, entrei na máquina do tempo e desembarquei no século XIX. Olhei a paisagem através de seus olhos de camponês. Subi pela longa estrada em direção à igreja de São Sabino que, através dos registros de nascimento e casamento, conservou viva a história. Essa mesma história que ainda hoje me conta que em 1895 Valentino Fasolato se casou com Elvira Pressato.

Imaginei Valentino enquanto tomava a decisão que mudaria a vida de toda a família: partir para o Brasil em uma viagem só de ida em um navio a vapor chamado Rosário, que depois de tantas viagens, em 1915, escolheu repousar no fundo do oceano. Enquanto tudo isso passava pela minha mente, os sinos da igreja soavam. Talvez tenham feito de propósito para que eu pudesse escutá-los como Valentino e Elvira os escutaram antes de partir. Apaguei as luzes da cidade na minha imaginação. Experimentei a escuridão, o inverno, a solidão e a fome, que fez com que eles abandonassem a sua pátria, os seus laços. Retorno sempre a Torreglia. Gosto de olhar a bela paisagem das colinas. Torreglia me contou muito da minha história. A Itália vai além dos cinco sentidos.

Acima: Torreglia, provincia de Padova. Abaixo, da esquerda, a casa onde morou Valentino, eu em uma visita a Torreglia e, por último, uma vista das Colinas Euganeas (Colli Euganei).
Valentino's house
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